Minha Primeira Viagem de Bicicleta – Uma Aventura com Meus Melhores Amigos.
Os meus amigos Carlos André (in memorian) e Cristiano eram meus parceiros de pedaladas. A gente tinha 19 anos de idade. O Cristiano tinha uma casa na praia da Maranduba nos anos 90, onde a gente costumava ir no verão. Ninguém tinha experiência com viagem de bicicleta, mas a gente tinha comentado algumas vezes de fazer uma pelo litoral. Então em Julho de 1992 a gente foi pedalando nossas mountain bikes de Maranduba, a praia mais ao sul de Ubatuba, até Castelhanos, no lado de fora de Ilhabela. Foi um percurso de ida e volta.
A gente não tinha acesso aos equipamentos que existem hoje, então muita coisa a gente improvisou mesmo. Muita coisa foi embalada em sacos de lixo, os “sanitos”, pra não molhar em caso de chuva e respingos de poças d’água. A comida foi a base de frutas, miojo, e lanches em padarias e lanchonetes. Panelinha velha, caneca, garrafas de água daquelas antigas azuis (acho que nem de PET eram), fogareiro e lampião de cartucho. Lanternas fracas, mas que quebravam um galho. Talheres pegos emprestados das cozinhas de nossas mães. Tudo equipamento improvisado. As roupas eram as comuns mesmo, nada de roupa especializada como se tem hoje. Hoje você entra numa loja da Decathlon e se equipa inteiro até que sem precisar gastar tanto. Naquela época não tinha disso. Equipamento especializado era normalmente caro, importado e difícil de achar. As poucas fotos, registros da viagem, foram feitas com uma máquina fotográfica de filme mesmo. Daquelas de 24 ou 36 poses que te faziam ficar pensando muito antes de fazer uma foto, se valia a pena ou não. A revelação depois era cara.
O percurso no mapa era seguir as linhas que ligavam as bolinhas representando as cidades, sem grande detalhes. Saúde e disposição a gente tinha de sobra. E levava um pouco de dinheiro contado no bolso. E assim a gente foi!
Dia 1 – Aprox. 55 km.
Saímos de manhãzinha de Maranduba, passamos por Caraguatatuba e fomos até a balsa em São Sebastião. Lá a gente atravessou pra Ilhabela, e pernoitamos em um Camping que hoje (2024) não existe mais (tinha um muro extenso de pedra, ficava perto de um rio, na Av. Pedro de Paula Moares).
Dia 2 – Aprox. 23 km, com uns 740 metros de desnível de subida.
Fomos do Camping da vila até o outro lado da Ilha, até a Praia de Castelhanos. Esse trecho foi o mais forte da viagem toda (e na volta também), pois a gente estava com as bikes pesadas e a subida até o ponto mais alto é constante. Quase que uns 11 km de extensão subindo sem nenhum platô para aliviar o pedal. Em estrada de terra, molhada e escorregadia. Em compensação, depois de passar o ponto mais alto da travessia, a descida foi um alívio, mas tensa também, por conta da terra escorregadia. Chegamos na praia de Castelhanos muito contentes com a sensação do feito, e apreciando a beleza da praia e seus entornos, com riachos de água fresca, muita vegetação exuberante, e areia limpinha. A praia de Castelhanos naquela época, nos anos 90, ainda era bem “virgem” e livre de construções. A beleza da praia foi nossa recompensa. No final da tarde passamos o perrengue tradicional de quem vai pra Ilhabela, que é o ataque dos borrachudos. Me lembro subindo no alto de uma árvore para tentar me afastar deles. E por falar em alto da árvore, a noite a gente transferiu e pendurou nossas bikes no alto de uma árvore, para evitar roubo enquanto a gente dormia, já que a gente não tinha cadeados. A barraca foi armada na areia da praia mesmo, debaixo de umas árvores.
Dia 3 – Aprox. 80 km, com uns 740 metros de desnível de subida.
A gente acordou no dia seguinte e depois de curtir um pouco a praia a gente resolveu voltar, porque estava frio e ventando bastante. Não tinha muito clima pra curtir a praia. Embalamos tudo de logo na saída o Carlos descobriu um pneu furado, então a gente parou pra ele trocar a câmara. Me lembro eu esperando ele arrumar e eu estava sendo atacado por um monte de borrachudo, logo pela manhã. Eu tentei me enterrar na areia pra fugir das picadas.
Mais um perrengue pra subir e vender novamente o desnível de 740 metros de um lado pro outro da Ilha. Descemos do outro lado e fomos pro camping próximo à vila de Ilhabela mais uma vez. A noite fomos pedalar pela vila e explorar os arredores de bike.
Dia 4 – Aprox. 50 km
Saímos do camping de manhã e fomos direto pra balsa. Atravessamos pra São Sebastião e tocamos direto pra Caraguatatuba e em seguida Maranduba, de volta na casa do Cristiano.
Considerações
Foi uma viagem marcante para nós. A gente se virou como pode, com nosso conhecimento limitado. Por exemplo, em um momento, depois de passar pela água do mar na areia da praia, minha corrente estava seca e sem lubrificação. E na casa do Cristiano eu coloquei óleo de cozinha na corrente da bike. Claro que ficou uma melequeira e não funcionou direito então quando a gente passou num posto o cara do posto colocou um óleo mais apropriado.
Acho que o mais importante é que naquela época a gente não se limitava por falta de equipamentos ou de infraestrutura. A gente tinha vontade de ir fazer então ia lá e fazia. As bicicletas eram o mais importante, e o resto a gente se virava. O meu bagageiro mesmo, eu fiz com varetas de alumínio. Panela, fogareiro, lampião, ia tudo pendurado pra fora, o que não cabia nas mochilas. O sentimento de compartilhar a aventura com amigos também era o mais importante. O companheirismo, a camaradagem, o respeito, consideração e zoação mútua. Um motivava o outro e um servia de exemplo por outro. Foi uma experiência muito legal que me fez pegar gosto pela ideia de poder viajar de maneira simples e minimalista.